ARTIGOS | Postado no dia: 20 outubro, 2025
Responsabilidade civil pelo abandono afetivo da pessoa idosa no direito brasileiro

Ao longo do envelhecimento, é natural que as pessoas passem a enfrentar dificuldades na realização de tarefas cotidianas, em decorrência da redução progressiva de suas habilidades e capacidades físicas e cognitivas. Diante dessa realidade, a família assume um papel fundamental na proteção e preservação da dignidade da pessoa idosa, atuando como principal rede de apoio.
A situação do abandono afetivo está cada vez mais comum nos vínculos familiares, sendo comum encontrar situações em que idosos são deixados em seus lares com promessas de retorno por parte de seus familiares que nunca se concretiza.
O Estatuto do Idoso é o principal instrumento normativo que assegura os direitos das pessoas com 60 anos ou mais. Em seu artigo 2º, estabelece que toda pessoa idosa goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, devendo esses ser assegurados sem prejuízo da proteção, preservação e garantia da dignidade. Assim, evidente que o abandono afetivo representa uma grave violação desses direitos garantidos.
A família, nesse contexto, desempenha papel essencial, sendo responsável por proporcionar proteção, cuidado e suporte emocional. Embora, muitas vezes, o abandono afetivo seja visto apenas sob a ótica moral, ele trata também de uma questão jurídica, já que a legislação impõe expressamente o dever de cuidado, atenção e amparo aos idosos por parte de seus familiares, especialmente os filhos.
O artigo 3º do Estatuto do Idoso determina que “é obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária”.
O abandono do idoso pode se manifestar de diversas formas, como a negligência no atendimento de suas necessidades básicas, a ausência de apoio emocional, o isolamento social forçado e a recusa em manter vínculos afetivos.
A Constituição Federal de 1988 reforça essa obrigação no artigo 229, ao dispor que “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.
O artigo 5º do Estatuto do Idoso dispõe que “a inobservância das normas de prevenção importará em responsabilidade à pessoa física ou jurídica nos termos da lei”, o que demonstra que o descumprimento dos deveres legais em relação aos idosos pode acarretar sanções civis e penais. Diversos tribunais já reconhecem o abandono afetivo como causa geradora de indenização por danos morais, quando demonstrada a omissão injustificada do dever de cuidado e atenção por parte dos filhos.
Ainda que o afeto em si não possa ser juridicamente imposto, o dever de convivência mínima, bem como de suporte emocional e material, é juridicamente exigível. Portanto, a proteção à pessoa idosa deve ser plena, abrangendo não apenas os aspectos materiais, mas também o respeito, a presença e o amparo emocional, os quais são devidos por aqueles que, por vínculo familiar e por determinação legal, têm o dever de garantir a dignidade dessa fase da vida.